quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Como entender o que está acontecendo no Brasil hoje?


Ontem à tarde, enquanto comprava pães em uma padaria próxima à minha casa, presenciei a transmissão “ao vivo” da posse do “novo” presidente, Michel Temer. A cena me fez lembrar do velho Marx segundo o qual a história nunca se repete, a menos que seja pela tragédia ou pela farsa.

Tragédias e farsas fazem parte do nosso contexto político, infelizmente, muito mais do que julgaríamos ser algo “aceitável”.

Como entender o que está acontecendo neste país? Uma presidente, eleita pelo voto popular é destituída de seu cargo, em nome de um suposto “crime” que não cometeu e que todos sabem que não cometeu.

Mesmo assim, é julgada, e afastada por por um parlamento que não tem condições de julgar com retidão nem mesmo os seus próprios pares.

Como entender mais esta “tragédia” da vida nacional brasileira?

Aqui, mais uma vez, “tragédia” e “farsa” andam de mãos dadas.

Pois bem, escrevo as linhas abaixo, como um desabafo, a quem interessar possa...

Existem dois projetos políticos para o Brasil que correspondem a dois modelos de Estado:

Um projeto de integração ao capitalismo global (com expropriação das riquezas nacionais e sua apropriação privada).
Este projeto se conjuga ao Estado Neoliberal, ou seja, a uma concepção de estado mínimo, enxuto, que deve funcionar como uma empresa, que deve reduzir os gastos sociais, e garantir ao capital sua reprodução ampliada.

Outro projeto é o do desenvolvimento nacional (com ampliação do mercado interno) e cautela em relação à administração das riquezas nacionais.

A este segundo projeto se conjuga um modelo de estado neodesenvolvimentista, com políticas públicas de:
- Combate à fome (redistribuição mínima de renda);
- Garantia de direitos trabalhistas;
- Desenvolvimento e fortalecimento da educação, como:
       - Construção de universidades;
       - O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID);
       - Políticas de acesso à educação superior:
       - Cotas (raciais e sociais);
       - PROUNE (com bolsas parciais e integrais de estudo em universidades privadas);
       - Ampliação do FIES; 
- Políticas de acesso à moradia:
       - Linhas de crédito imobiliário destinado às populações de baixa renda;
       - Subsídio para imóveis de baixo valor de mercado, destinados às populações de baixa renda.

Em relação aos diferentes projetos para o Brasil, caberia levantar algumas questões importantes:

Qual é o projeto de país que a elite econômica brasileira quer?

No Brasil, as classes positivamente privilegiadas no mercado estão preocupadas com o combate à fome, com o combate ao analfabetismo, com o combate à pobreza?

A população brasileira tem consciência da dívida moral que o Brasil tem com os afrodescendentes?

A população brasileira tem consciência da dívida moral para com as populações autóctones brasileiras, indevidamente denominadas como “populações indígenas”?


No Brasil existe uma diferença muito grande entre a história e a “história oficial”.

Vamos pegar como exemplo algo sobre o qual os “brasileiros” nem refletem mais. Vejamos o caso dos “índios”.

Qual é o papel atribuído aos índios na história do Brasil?

O papel de sujeito alheio ao processo de “civilização” representado pelos colonizadores/conquistadores europeus.

O índio sempre foi pensado como um “entrave”, um “obstáculo”, mais recentemente, até mesmo como um “estorvo” ao “progresso”.

Por baixo destas ideias existe uma história que foi apagada da mente dos “brasileiros”.

Os índios foram muito importantes na colonização brasileira.

Por muitos anos, a principal língua falada no Brasil não foi a língua portuguesa, mas sim o Tupi.

Como diz Darcy Ribeiro, nós só não somos um país bilingue por causa da gana dos portugueses.

Observem os nomes da toponímia paulista: Araçatuba, Araraquara, Avaré, Barueri, Bauru, Botucatu, Butantã, Caraguatatuba, Guaratinguetá, Ibirapuera, Indaiatuba, Itaquaquecetuba, Piracicaba.

Todos estes nomes são Tupi. Por que estas regiões receberam estes nomes? Foi porque os portugueses acharam “bonitinhos”, “agradáveis”, ou teria sido pelo seu “exotismo”? Claro que não, receberam esta denominação porque eles eram significativos no período. Eles faziam parte da língua que era falada!

A nomenclatura Tupi não está restrita à topografia de São Paulo. Ela está presente em muitos outros locais, como por exemplo:

Iguaçu, Iguatemi, Itajaí, Mandaguari, Paraná, Paranaguá, Tatuapé, Tijuca...

Até mesmo “Curitiba” (que em Tupi significa um ajuntamento de pinheiros).

Quais são as representações sociais sobre os “índios” no Brasil?

- Eles são tidos como “indolentes”, “preguiçosos”, “vagabundos”, “aculturados” etc.

- Acredita-se que eles “não serviam para o trabalho escravo”, e que por isto o Brasil teve que importar os negros, trazidos da África.

Enquanto brasileiros, ignoramos que grande parte da colonização brasileira foi feita através de trabalho escravo indígena.

Por isto, o índio brasileiro já chegou a ser considerado como o “negro da terra”.

Mas o que sabemos sobre estas coisas?

Absolutamente nada.

O que sabemos sobre o papel do negro na produção da riqueza brasileira?

Nada! Eles foram gastos como “sacos de carvão” na indústria do engenho de açúcar no Brasil!

Após a abolição da escravidão o que foi destinado a eles?

Nada. Para sobreviver abarrotaram as periferias das cidades, já que com a “Lei de Terras, criada em 1850” toda a terra brasileira tinha dono e assim, logo após a abolição da escravidão, negro aforriado não tinha como ter acesso à terra para dela tirar sua subsistência.

Voltando aos índios, quando da colonização do Brasil, houve uma disputa entre dois projetos políticos para lidar com as populações indígenas brasileiras:

Por um lado, havia o projeto português para explorar as novas terras e dela extrair a maior quantidade de riquezas possível.

Por outro lado, havia o projeto espanhol de catequizar os índios e construir uma república pia com a população autóctone.

Surgiram as missões jesuíticas que abrangiam partes dos território sul brasileiro, e dos território que atualmente fazem parte da Argentina e do Paraguai.

Estas missões organizaram verdadeiras cidades indígenas, altamente organizadas e autossustentáveis.

Na disputa entre os missionários e os portugueses, qual projeto prevaleceu?

Não é difícil “advinhar” a resposta: o português.

O que aconteceu com as missões jesuíticas?

Foram assaltadas pelos bandeirantes paulistas que aprisionaram os índios e os levaram para vender como escravos para o sudeste e nordeste brasileiro.

O que a maior parte da população brasileira sabe a respeito desta história no Brasil? Nada.

Ficaram as ruínas das construções, que na cabeça dos “brasileiros” são no máximo mais um dos “pontos turísticos” que podem ir a ser visitados, como por exemplo, é o caso dos Sete Povos das Missões no atual estado do Rio Grande do Sul.

O que nós brasileiros, sabemos sobre nós mesmos?

O que nós brasileiros sabemos sobre nossa inserção na história?

O que sabemos sobre a história dos nossos irmãos latino-americanos?

O que somos hoje e o que seremos no futuro, está ligado ao nosso passado colonial, e às nossas mazelas histórico-sociais que se seguiram.

A política não anda “sozinha”. Ela não é uma esfera autônoma da realidade social, que de tempos em tempos precisa ser expurgada, para retomar o seu “caminho natural”.

Vamos fazer um “combate à corrupção”, vamos afastar uma presidente eleita e vamos deixar as coisas voltarem à “normalidade”.

Não existe “normalidade”, a sociologia, a antropologia e a ciência política nos ajudam justamente a “desnaturalizarmos o mundo social”, a reconhecermos como ele foi constituído e é dialeticamente (re)produzido.

A política nunca para. Ela está em constante “movimento”.

O que precisamos fazer? Precisamos montar as peças do tabuleiro. Não temos apenas um quebra-cabeças a reconstituir sobre o Brasil. Fazemos parte de um jogo muito importante, e muitas vezes, não nos reconhecemos como componentes deste jogo.

Há décadas se fala que a educação é o caminho para o desenvolvimento do nosso país. Pois bem, ela não é o apanágio para os dilemas brasileiros. Mas de fato ela é fundamental!

Porém, já houve momento histórico no qual a educação fosse tão pouco valorizada como é nos dias de hoje?

Estamos em 2016, para muito de nós o “futuro já chegou”.

Sou nascido na década de 60. Quando era criança, imaginava o que seria nos anos 2000. Sempre gostei muito de tecnologia, sonhava com o que futuro poderia nos reservar.

Hoje vivemos a ideia da “aldeia global”. Nunca as comunicações foram tão rápidas como atualmente. Muito da ficção científica da década de 70, se tornou realidade. Telefone celular, internet, mídias digitais.

Porém, se por um lado a tecnologia trouxe muitos avanços, por outro lado, ela tem possibiitado tremendos retrocessos.

Nunca se comunicou tanto no planeta Terra como hoje. Em contrapartida, nunca houve tanta “desinformação”, principalmente no Brasil.

Ao lado das redes de telecomunicações, como no Brasil, a “Rede Globo” há as redes sociais, que tem como substrato a internet.

A internet integrou o mundo! Posso comprar o que quiser em qualquer lugar do mundo e fazer operações financeiras em tempo real.

Quais foram os avanços que as redes sociais trouxeram?

Elas “aproximaram as pessoas”, agora podemos percorrer o globo com apenas alguns cliques no mouse. Resultado da globalização! Posso conversar com qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo, a qualquer momento, com som e com imagem! Viva a globalização tecnológica!

Mas este poder comunicacional trouxe avanços para sabermos quem somos, de onde viemos, para refletirmos para onde vamos?

Infelizmente, não!

O que assistimos pela “rede” é a demonização da política, é o desenvolvimento de todo tipo de preconceito social, como a homofobia por exemplo. Há um recrudescimento dos preconceitos contra grupos, seja por questões raciais, regionais, étnicas ou mesmo sexuais.

Que avanço!!!

Parece que ao invés de “evoluirmos” no que se refere a questões como o “respeito” à humanidade, involuímos no sentido de atingirmos patamares da mais baixa condição possível de sociabilidade, a do desprezo, da difamação e da violência simbólica contra o alterno (aquele que não faz parte do “meu grupo”, seja ele social, afetivo ou político).

Se por um lado, através do facebook, as pessoas se projetam com suas máscaras sociais, por outro lado, muitas vezes elas se “desnudam” no que diz respeito aos seus preconceitos.

É como se o vitual estimulasse os indivíduos, ao mesmo tempo, a mostrar aquilo que eles querem que as pessoas vejam deles, ou a forma como querem serem vistos, e também possibilitasse demonstrar aquilo no qual eles verdadeiramente acreditam. Num mesmo produto, parte da aparência e parte da essência.

Talvez estejamos frente a uma nova forma de (re)construção das identidades, uma forma mais tecnológica, mas também ainda mais narcisística.

Assim, ao invés de usarmos a tecnologia para progredirmos, para conhecermos e respeitarmos as diferenças, a utilizamos para nos alienar cada vez mais da realidade.

Além da desinformação das redes sociais, há o entretenimento digital revisitado, agora não mais como ficção a ser consumida, mas como competição narcisista entre internautas.

Não basta ter o carro do ano, não basta fazer a “viagem dos sonhos”, não basta estar com as “pessoas” amadas. É necessário mostrar, exteriorizar, publicar, publicizar a individualidade e em alguns casos até mesmo a mais grotesca intimidade, como se fizéssemos parte de um grande reality show.

Enquanto isto, o mundo ao nosso redor, muda o tempo todo, e nós corremos o risco de sermos apenas espectadores olhando para nossos “espelhos digitais”. Ou no máximo coadjuvantes de um roteiro muito bem traçado, sem sequer saber, que fazemos parte da grande trama “global”.

De tempos em tempos, podemos ser chamados “a atuar” no grande “circo”, para demonstrar nosso potencial de manifestação social “espontânea”. Mas a maior parte das vezes, somos chamados a assumirmos nosso papel de “telespectadores” da realidade social brasileira.

Sentados em nossas poltronas, seja no conforto da sala de estar, seja atrás dos volantes dos nossos veículos, seja atrás das mesas de escritório, nos bancos escolares, ou mesmo nas fábricas, todos nós temos uma função principal a ser repetidamente desempenhada: a de sermos espectadores dos novos capítulos que virão.

De tempos em tempos, mudam os personagens, mas a dramaturgia sempre segue a mesma linha e o mesmo modelo. É como se assistíssemos sempre e repetidamente uma mesma trama, mas sem conseguirmos perceber.

Enquanto isto, o país parece seguir o seu destino. Rumo à “justiça” e ao “fim da corrupção”. Que legal! Presidente novo! Hino Nacional! Isto me faz lembrar da minha infância, quando via o General Geisel discursando na TV, enquanto brincava com meus carrinhos na sala da minha casa.

Parece que nada mudou. Afinal, a velha questão da ordem!

Brasil, “ordem e progresso”!

Brasil, “ame ou deixe-o”!

Ordem de quem? Ordem para quem? Qual é o projeto de país que está retomando ao poder hoje?


Não é à toa que temos assistido ao crescimento do pensamento conservador no Brasil.

Este pensamento fornece parte da base ideológica para a retomada do poder no país. Nada melhor para reconhecer a “necessidade da ordem”, que ressaltar a presença do “caos”, nada melhor que criar um panorama de “crise”.
“Crise econômica”, “crise moral”, “crise nos conteúdos escolares”, “crise na prática dos professores”. Crise por todos os lados.

Quanto ao crescimento do pensamento conservador no Brasil, temos dois exemplos recém saídos do forno:

O Projeto “Escola sem partido” que consiste na supressão de temas políticos nas escolas. Segundo este, a educação política deve ser dada pelos pais em casa, não pelos professores nas escolas, sob o risco de “doutrinarem” os alunos.

Outro exemplo a tal “ideologia de gênero” - Temas como o respeito às diferenças sexuais não devem ser tratados na escola. Não devemos dizer aos nossos alunos, que além de “meninas” e “meninos”, existem pessoas que se veem a si mesmas de formas diferentes.

Educação sexual é tarefa dos pais! (sem dúvida! Mas os pais também ensinarão aos seus filhos que, apesar de suas convicções religiosas, existem grupos que se comportam de maneiras “diferentes” e que as pessoas destes grupos também são dignas de respeito?). Suspeito que não!

Se o professor na escola disser que existem pessoas que “escolheram ter um gênero diferente do fenótipo que possuem”, e que apesar disto, por fazerem parte da humanidade, tanto quanto os “meninos” e as “meninas”, precisam ser tratados com dignidade e respeito, ele estará praticando um crime?

Na cabeça de alguns, se nossos filhos tiverem acesso a este tipo de informação, e se tiverem que conviver com outros tipos de “gênero” talvez eles também possam querer assumir uma identidade sexual “diferente” das “tradicionais”. Quanta ingenuidade!

Será mesmo ingenuidade? Será insegurança? Será só isto mesmo?

Tenho minhas dúvidas!

Então, de acordo com este modo de pensar, se o mundo nos apresenta um problema, o da diversidade sexual, ao invés de olhar para os dados empíricos e preparamos nossos filhos para lidar com o mundo real, é preferível tamparmos o sol com a peneira!

Ignorar os fatos é a melhor forma de se relacionar com a realidade? Não seria melhor refletir sobre eles, procurar entendê-los, compreendê-los? Aprendermos a conviver com a realidade não significa que vamos literalmente nos conformar a ela (quer dizer tomar a sua forma).

Os defensores destas ideias (da tese da “escola sem partido” e da luta contra a “ideologia de gênero”) assumiram um suposto “papel histórico”, o de defender, com unhas e dentes, a sociedade brasileira destas duas novas formas de “ameaça”.

Assim, assistimos, atônitos as propostas de criação de leis que impedem a discussão de assuntos como política e identidades sexuais nas escolas. Isto, em pleno século XXI!
Estas leis estão sendo propostas e apoiadas pelos congressistas das bancadas mais conservadoras do Congresso Nacional (que envolvem os ruralistas e os religiosos, dentre outros).

Isto é apenas um sinal de algo muito mais grave que tem ocorrido na sociedade brasileira. A interpenetração da religião na política e da política na religião.

No afã de levar adiante seu plano de retomada dos rumos da nação, a “velha guarda” da política nacional não mediu esforços para disseminar sua ideologia do “caos” e da necessidade de conclamar as “massas” às manifestações “públicas” supostamente “anticorrupção até mesmo no interior dos templos.

No país inteiro, com raríssimas exceções, os púlpitos das igrejas foram usados, sobretudo os das igrejas evangélicas, para conclamar a população a participar das manifestações de combate à “corrupção”, que na verdade eram apenas a fachada para o projeto de destituir a presidente Dilma do cargo que ocupava.

Uma vez cumprido o seu objetivo principal, os pastores se calaram. Muito interessante! Caberia perguntar a estes:

- E o combate à corrupção, “já acabou?”
- Pessoal, cadê o combate à corrupção? Vai ter passeata, quando vai ser? Também quero participar!!! Vamos lá!!!


Quais são as consequências desta interpenetração? 

Ao meu ver são desastrosas!

Por um lado, utilizar líderes religiosos para fins político-partidários é algo vergonhoso! Chega a ser totalmente antiético e imoral.

Por outro lado, abrir brechas na legislação para redirecionar conteúdos e práticas escolares, de acordo com valores desta ou daquela religião, entra em choque com o caráter laico do Estado brasileiro. Tratam-se de retrocessos histórico-sociais terríveis.

O que a sociedade faz a respeito? Nada! Ou melhor, uma grande parte dela, apenas reproduz os discursos da desinformação.

Como já disse anteriormente, temos dois projetos de “modernização” para o Brasil.

A velha guarda está retomando o país para colocar em prática o seu “projeto” de “modernidade” para a nação, e principalmente, para a sua elite.

Face a esta situação surgem uma série de questões:

Quais serão as consequências deste projeto para nós os cidadãos brasileiros?

Quais serão as consequências deste redirecionamento para o “nosso” patrimônio nacional?

Estou falando do pré-sal, estou falando da Amazônia, estou falando das potencialidades que o Brasil possui para ser uma economia autossuficiente.

Quais serão as consequências para a educação?

Como ficará o combate ao analfabetismo?

Como ficará o combate à fome e à miséria?

Como ficarão as populações indígenas?

Estas são questões que se colocam como incógnitas para o futuro do nosso país.

Para onde estamos caminhando?

No desdobrar dos acontecimentos caberia ainda salientar, apenas citando os personagens mais recentes:

Tancredo Neves é eleito, mas quem fica é José Sarney,

Entra Fernando Color, mas quem fica é Itamar Franco,

Entra Dilma Rousseff, mas quem permanece é Michel Temer...

Em que pese as especificidades políticas e históricas que fazem parte dos contextos específicos destas personagens, são tantas as “coincidências”, que pergunto: como não ter a sensação de Déjà Vu? Mudam as personagens, mudam os contextos, mas infelizmente a estória continua.

Quando vamos retomar a nossa história pelas nossas próprias mãos?

Por um período, já vivemos este sonho.

Marcelo Cernev
01.09.2016

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Baderna ou cólera?

Prezados, reproduzo abaixo trecho do post do professor e amigo Givaldo Alves que apresenta uma análise sobre a suposta "Baderna na USP". Sua análise traz, dentre outros elementos uma entrevista de Michael Lowy, que fora incrivelmente (no sentido pleno da palavra) publicada pelo jornal Estadão em novembro de 2011.

Ainda que tenha se passado quase 7 meses a análise continua sendo muito pertinente, a respeito de uma problemática atual. Segue abaixo a publicação.

Marcelo Cernev



Car@s amig@s!
Por incrível que pareça o Estadão publicou uma entrevista com  Michael Lowy. Convido a tod@s a arranjarem um tempinho para ler e refletir acerca da análise do ilustre professor sobre as insurgências da juventude, inclusive no caso da USP.

Tenho lido diversas manifestações de cunho pragmático condenando os alunos da Usp por estarem protestando ao invés de estudar já que estão na melhor universidade pública da América Latina.

Pois para mim é exatamente por isso que devem protestar. A história mostra que para perder os dedos basta que deixemos nos levar os anéis. Sendo assim, quem tem tudo não pode deixar que se perca nada.

Por outro lado, aqueles que julgam apressadamente os estudantes da USP, se valendo dos argumentos prontos do PIG, sob meu ponto de vista, ao invés de condenarem os que têm tudo deveriam lutar (como eles fazem)  para equiparar suas condições às condições deles.

No mais, fiquem com a entrevista de Michael Lowy.

O transbordo do copo de cólera

13 de novembro de 2011 | 3h 09
Juliana Sayuri – O Estado de S.Paulo

Quando era um jovem de 18 anos, estudante de ciências sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), ainda nos tempos da Rua Maria Antônia, ele assistia às conferências de Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, José Arthur Giannotti, Otávio Ianni e Paul Singer, mentores que o convidaram a participar do prestigiado núcleo de estudos de O Capital. Aos 26, pupilo de Lucien Goldmann e laureado sociólogo pela Sorbonne, em Paris, foi estudar hebraico num kibutz e lecionar história na Universidade de Tel-Aviv, em Israel. Aos 30, com o Maio de 68 sacudindo a França, recebeu (e aceitou) um convite para lecionar na Universidade de Manchester, na Inglaterra. Em 1970, ainda longe dos 40, descobriu-se persona non grata no Brasil do general Médici, tornou-se um judeu paulistano sem passaporte brasileiro e se estabeleceu definitivamente em Paris para estudar Marx, Lukács e Guevara.
Estudantes em confronto com a PM na USP - ANDRE LESSA/AE
ANDRE LESSA/AE
Estudantes em confronto com a PM na USP
 
Agora, rejuvenescido aos 73, o sociólogo Michael Löwy anda entusiasmado com a volta dos estudantes às ruas brandindo livros de Marx e Walter Benjamin. “Não pode haver um movimento que não se refira às lutas, às vítimas, aos mártires e aos pensadores do passado porque nós nunca partimos do zero”, diz. Objeto de estudo em As Utopias de Michael Löwy: Reflexões sobre um Marxista Insubordinado, de Ivana Jinkings e João Alexandre Peschanski (Boitempo, 2007), organizador de Revoluções (da mesma editora) e atualmente pesquisador do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) de Paris, nas últimas semanas Löwy acompanhou o noticiário da ocupação (e a posterior desocupação) da reitoria da USP. Interpretou como “faíscas” o clamor dos estudantes contra a presença policial e os berros por liberdade para se fumar maconha no câmpus. “O que se passa é muito maior que isso. Há uma indignação com a ordem das coisas no mundo. Um sentimento de cólera. E, diante dessa percepção de injustiça, os estudantes têm um papel essencial, começando movimentos de protesto. Não podemos subestimá-los.” A seguir, a entrevista que Löwy concedeu ao Aliás, por telefone, de sua residência na capital francesa.
Estudantes ocupando praças em Nova York, Madri, ruas em Santiago, a reitoria na USP. Estamos diante de um arrastão de rebeldia ou são episódios isolados?
Não são episódios isolados. São parte de um processo internacional que lembra os anos 1960. Quando há um sentimento de injustiça e insatisfação na sociedade, os estudantes são os primeiros a se organizar e a protestar. Agora, na maioria dos casos, seja na Europa, no Chile ou nos Estados Unidos, não são apenas estudantes. É a juventude em geral. Os estudantes naturalmente têm um papel importante, mas é um movimento bem mais amplo, ao qual vão se agregando outros grupos – desempregados, trabalhadores, sindicalistas. Torna-se algo muito plural. O que há de comum é a indignação. Essa palavra está servindo como um sinal de identidade dos protestos. Há uma indignação muito grande que pode estourar por com um pretexto mínimo. No caso de São Paulo foi uma intervenção policial na USP. Mas poderia ter sido outra faísca.
Indignação com o quê? No caso da USP, pode-se ter a impressão de que é com a impossibilidade de fumar maconha no câmpus.
É muito maior que isso. Há uma indignação com a ordem das coisas no mundo. Um sentimento de cólera – e cólera com alta qualidade ética e política. O começo de qualquer movimento ou mudança social sempre se dá com um estado de espírito indignado, a começar na juventude. E fácil de entender o porquê de tanta indignação. Estamos numa situação em que a ordem social parece cada vez mais irracional, promovendo desigualdades gritantes, promovendo os excessos do mercado financeiro, a destruição do meio ambiente. As razões para a indignação são evidentes. Têm a ver com o sistema. Por mais que comece com uma história de maconha e confronto com a polícia, acaba se transformando em um protesto antissistêmico. Em última análise, o objeto de indignação é o poder exorbitante do capital mostrando a sua irracionalidade e desumanidade. Muitas vezes, isso é formulado explicitamente nesses termos. Outras, não. Mas a questão está subjacente em todos os protestos recentes. Nós, sociólogos, precisamos tentar entender por que isso não começou mais cedo. Porque as razões para a indignação já existiam. Pelo jeito, foi necessário uma acumulação de descontentamento e um sentimento de que não é mais possível tolerar tal situação. E de que é preciso se revoltar, sabendo ou não se se conseguirá impor alguma mudança. Há um imperativo categórico de revolta, no sentido kantiano. Há coisas que você precisa fazer, mesmo sem ter certeza de em que vai dar. E quanto maior a participação ativa dos jovens, dos estudantes e de outros setores, cria-se uma relação de forças que pode pelo menos impor limites ao sistema e, sobretudo, criar uma tomada de consciência. Isso talvez seja o mais importante: a tomada de consciência. O Ocupe Wall Street não conseguiu arranhar o capital financeiro, mas despertou consciência crítica em grandes setores. Eis um evento importante. Histórico até.
Ocupações, greves e passeatas ainda são formas eficazes de protesto?
São as formas clássicas de protesto, que reaparecem sempre. Mas também há formas novas surgindo. Por exemplo, a comunicação através dos meios eletrônicos, como o Facebook e o Twitter, que permitem uma mobilização muito rápida. E as mobilizações de agora têm um caráter festivo, lúdico, com música, dança, festa, o que é próprio da expressão da juventude. O Facebook e o Twitter têm lugar importante, mas não é o caso de mitificá-los. Eles não bastam. Para que alguma coisa aconteça, você tem que sair de sua casa, descer à rua, reunir-se com outras pessoas, ir lá, brigar, protestar, talvez enfrentar a polícia. Então, o Facebook é um suporte, não vai substituir a ação direta das pessoas.
A juventude tem voz além do Facebook? Ela se sente representada politicamente? 
Pouco, porque a representação política está nas mãos de setores sociais mais acomodados e de “mais idade”. Os jovens não se sentem representados. Há uma grande desconfiança em relação aos partidos e às instituições políticas existentes. Há certo rechaço a isso, muitas vezes com razão. Uma atitude cética diante da política institucional. Mas isso não quer dizer que haja desinteresse por eventos políticos. No meu tempo de aluno da FFLCH, nos anos 50, poucos estudantes achavam necessário ou sentiam vontade de se engajar em organizações políticas. Havia politização, mobilização em torno de determinadas causas, mas atividade política organizada era para uma minoria. Tenho a impressão de que atualmente a politização e a militância política são maiores do que nos anos 50, mas menores do que nos 60 e 70, durante a ditadura militar.
E podemos interpretar os protestos como um grito por participação política?
Analisemos o caso do Chile, que teve o movimento mais amplo até agora. Não é só um grito, é um protesto em cima de uma questão concreta: a privatização do ensino público desenvolvida no governo Pinochet, que não foi mudada pelos governos de centro-direita ou centro-esquerda que o sucederam. Trata-se de uma questão que concerne a todos os estudantes: o quase desaparecimento do ensino público gratuito, os preços exorbitantes da educação. E isso se coloca também no Brasil, na Inglaterra. Por toda a parte há essa tendência de transformar a educação em mercadoria, em indústria que deve dar lucro. E assim vai desaparecendo a educação pública gratuita, que era uma conquista de muitos anos de luta. O protesto dos estudantes chilenos começou criticando a privatização do ensino e depois tomou um caráter mais amplo, porque eles perceberam que os problemas na educação são parte de uma orientação geral de um sistema neoliberal. Notaram que esse modelo de educação é inseparável de questões maiores e, assim, o movimento ganha apoio de outros setores da sociedade.
A ideia de autonomia universitária está sendo colocada em xeque? 
Autonomia universitária significa que o papel da universidade é transmitir conhecimento, cultura, ciência – e não mercadorias. Quando o papel do ensino se resume a permitir que estudantes adquiram um diploma, ou a prepará-los para encontrar um posto a serviço do management, do marketing, perde-se a qualidade humana, cultural e pedagógica da universidade. As universidades estão se tornando meras empresas voltadas para a produtividade, a racionalidade instrumental mercantil. E, obviamente, boa parte dos estudantes e professores resiste a isso, defende o estatuto da universidade como lugar de produção de cultura e conhecimento, com autonomia em relação ao mercado, à economia e às empresas.
No caso da USP, os estudantes se tornaram massa de manobra de partidos e sindicatos?
Não, pelo contrário. Há uma relação de desconfiança dos estudantes em relação aos sindicatos e sobretudo aos partidos. Uma parte do movimento sindical, geralmente a parte mais radical, se aproxima do movimento estudantil em busca de aliança. Mesmo que haja certo interesse dos jovens nessa aliança, ela não se dá com facilidade, porque os objetivos dos sindicatos são mais limitados. Os ritmos não são os mesmos, a cultura política não é a mesma. Então, há uma diferença que dificulta essa aliança. Mas, para os estudantes, é importante conseguir criar uma situação em que os sindicatos resolvam participar da mobilização. Isso tem acontecido no Chile, na Espanha, na Grécia, nos EUA. Longe de serem manipulados pelos sindicatos, esses movimentos de protesto têm grande autonomia. Eles buscam estabelecer a aliança, mas não no sentido de se tornarem apêndice dos sindicatos. Com os partidos políticos é mais complicado, porque a desconfiança é maior. Não há um único partido que controle ou manipule esses movimentos mundo afora.
Ao serem presos, estudantes da USP brandiam livros de Marx, Foucault e Walter Benjamin, imagens de Mao e Che Guevara. Essas referências continuam atuais?
É normal que cada vez que apareça um movimento de crítica antissistêmica as pessoas se refiram a personagens e pensadores que já exprimiram essa crítica. Então, Marx aparece como referência importante, porque ele foi o primeiro a elaborar uma crítica radical do sistema capitalista. Em muitos pontos, essa crítica é até mais atual hoje do que na época em que ele a escreveu. Fico feliz de saber que há estudantes que se referem ao pensamento desses autores. Benjamin tem uma reflexão profunda sobre o que é a modernidade capitalista, a ideologia do progresso. Ele dá elementos que Marx não dava. Guevara também é importante, sobretudo, como homem de ação e símbolo do compromisso ético com os ideais de libertação e emancipação. Tudo isso é necessário. Não pode haver um movimento, qualquer que seja, que não se refira às lutas, às vítimas, aos mártires e aos pensadores do passado, porque nós nunca partimos do zero. Mas, evidentemente, isso não basta. Precisamos também pensar com novos instrumentos teóricos para dar conta das questões que estão aparecendo neste começo do século 21. Por exemplo, a catástrofe ecológica que está se perfilando. Ela precisa de uma reflexão atual, utilizando elementos teóricos mais atualizados.

O sr. é um estudioso das revoluções dos séculos 19 e 20. Qual foi o papel dos jovens e estudantes nelas?
Depende, porque as revoluções são diferentes entre si. Em geral se pode dizer que a juventude sempre jogou um papel importante em qualquer movimento revolucionário. É uma constante. Movimentos revolucionários são levados por jovens, muitas vezes. Agora, se são estudantes ou não, isso depende da época, do país. Na Revolução Russa os estudantes não tiveram muito espaço. Na Revolução Cubana, sim. O Maio de 1968 em Paris foi um movimento totalmente estudantil. E um dos gatilhos foi a invasão da Sorbonne pela polícia. Na França, ainda hoje, a polícia entra raramente na universidade. Justamente porque se sabe que há o estatuto de autonomia das universidades e intervenções policiais provocam a reação dos estudantes. A polícia simboliza o autoritarismo do Estado contra a juventude, contra os estudantes. Esse choque com a polícia é frequente e, em certas circunstâncias, se transforma na faísca que mencionei antes, a que faz um protesto eclodir. Não podemos subestimar o papel dos estudantes nas revoluções.
Os da USP foram chamados de bichos grilos de grife, filhinhos de papai, rebeldes sem causa, maconheiros mimados… Como o sr. avalia esse tipo de tratamento?
Qualquer questionamento da ordem sempre é ridicularizado. Agora, sobre os estudantes serem meninos ricos… É uma mitificação, porque a maioria deles é de origem popular. Não são filhos de latifundiários, como eram os estudantes de antes da 2ª Guerra Mundial. Hoje em dia, a educação se tornou mais popular. Sobre a maconha: na minha opinião, não há razão para transformar o consumo de maconha em assunto de polícia. A maconha não é nem melhor nem pior do que o tabaco e a cerveja e tem um caráter bem diferente das drogas mais perigosas, como cocaína e crack. Então, essa reivindicação de descriminalizar o consumo da maconha me parece bastante razoável. Mas isso foi só um pretexto, porque em cima do tema se armou uma briga e, quando se manifestou o autoritarismo da polícia e do governo, aí assim o protesto cresceu. Muitos estudantes que aderiram à manifestação não o fizeram devido à questão da maconha e sim devido à repressão indiscriminada e arbitrária sobre alunos.
A sociedade brasileira clama por ordem?
Não é a sociedade em seu conjunto que se volta contra os estudantes com esse discurso de ordem e repressão. É a imprensa e os representantes da ordem e do governo. Eu me pergunto se parte da população não simpatiza com esses protestos da USP. Pelo menos foi o caso em outros países onde protestos dos jovens e estudantes se tornaram a expressão de um grande movimento popular. Não estou dizendo que isso vá acontecer já no Brasil, mas não há essa dicotomia entre jovens e estudantes de um lado e o restante da sociedade do outro. Essa separação é do interesse da classe dominante, dos governantes mais reacionários, como tentativa de mobilizar a população contra os estudantes.
O governador Geraldo Alckmin disse que os estudantes da USP precisavam de uma aula de democracia…
Nós sabemos que no Brasil não há nada mais democrático do que a Polícia Militar (risos). Ela tem uma tradição de várias dezenas de anos de democracia, não é? Democracia do cassetete – que não acho que deva ser a forma mais avançada de democracia. Não deve ser muito sério o argumento do sr. Alckmin. Uma intervenção policial brutal não tem nada de democrático.

Alguns autores contemporâneos, como o irlandês John Holloway, valorizam a articulação dos novos movimentos. Ao contrário do que dizia Marx, agora é possível mudar o mundo sem tomar o poder?
Holloway me deu o livro dele e pediu para que eu fizesse uma resenha, sabendo que eu iria criticá-lo. O livro Mudar o Mundo sem Tomar o Poder tem muitas ideias interessantes e toda a crítica que ele faz ao sistema me parece muito profunda. Mas acho que a proposta dele não faz sentido, porque qualquer ação social e política inevitavelmente implica uma forma de poder ou de contrapoder. O que se coloca é garantir que esse poder seja efetivamente democrático. O movimento, ele mesmo, tem formas de poder, de organização e de gestão democrática. Protesto, revolta e revolução, tudo isso não pode existir se não houver uma organização de uma forma de poder. Não podemos contornar a questão do poder, porque na política não existe vazio. A necessidade é que esse poder seja democrático. Essa é a resposta.
No livro Revoluções, o sr. destaca como os revolucionários muitas vezes são vencidos pela história. Os estudantes de hoje serão vencidos?
Não posso dizer. Mas podemos já constatar, nos países árabes concretamente, que esses movimentos de protestos da juventude não foram vencidos. Eles derrubaram duas ditaduras sinistras, na Tunísia e no Egito, com uma mobilização desarmada. Não estou dizendo que isso será uma regra, mas mostra que não há nenhuma fatalidade. As revoluções são sempre imprevisíveis, acontecem onde ninguém espera.
SOCIÓLOGO E PESQUISADOR DO CENTRE NATIONAL DE LA RECHERCHE SCIENTIFIQUE (CNRS), DE PARIS.




Fonte: http://givaldoalves.wordpress.com/

segunda-feira, 18 de julho de 2011

A "Democratização da Docência no Ensino Superior" e uma estranha matemática (Democratização = Mercantilização + Precarização?)

Prezados,

A educação é um assunto sempre presente na pauta dos discursos políticos. Em época de campanha é muito comum frases como "Precisamos investir em educação"; "Precisamos qualificar nossos professores"; "Precisamos remunerar melhor nossos professores"; "Precisamos democratizar a educação" etc.

Particularmente não duvidamos de que haja pessoas que efetivamente se preocupem e que trabalhem, para o avanço e o desenvolvimento de uma área tão importante para o nosso país.

Porém, infelizmente - e isto não é novidade para ninguém - nem sempre as práticas correspondem aos discursos. Muitas vezes o que acontece é justamente o oposto.

Este é o caso da proposta de "Democratização do Ensino Superior" que foi apresentada, há poucos dias, por um "ilustre" senador paranaense.

Veja a análise que O Alienista faz desta "proposta" e tire suas próprias conclusões.

http://givaldoalves.wordpress.com/?s=democratiza%C3%A7%C3%A3o+da+educa%C3%A7%C3%A3o.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Voltando a discutir sobre o desarmamento!

Nesse momento, após a tragédia do Realengo, em que as atenções se voltam novamente para a questão do desarmamento da sociedade, vale a pena nos lembrarmos da postura da "Veja":


Na época, a Veja defendeu descaradamente a indústria armamentista!
Não nos esqueçamos disso!!


Adriana

Assassinatos na escola em Realengo: o que isso nos ensina?

Reproduzo abaixo texto fantástico do blog mariafro.com.br, comentando sobre a tragédia do Realengo!
É necessário lermos e meditarmos sobre o que aconteceu!!

Adriana

"A escola deve ser espaço mais sagrado que qualquer templo"

Acordo muito cedo, levo minha filha pra escola, volto e por volta das 7 H retomo minha rotina. Sou educadora, aprendi a ser desde quando, no 1º ano da Universidade, entrei numa sala de aula de Educação de Adultos, depois em salas de 3º ano de Ensino Médio, e depois com crianças de 6º e 7º anos do Ensino Fundamental e, paralelamente, formando professores em diferentes cursos de formação mas, especialmente, na formação para a educação em direitos humanos, na educação para a igualdade étnico racial.
Educar é a minha vida, acredito que podemos educar em todos os espaços sociais (no mundo off line e no mundo on line).
Hoje, pela manhã, em Realengo, Rio de Janeiro, Wellington Menezes Oliveira conseguiu entrar armado na escola municipal Tasso da Silveira (de Ensino Fundamental),  e até o momento as notícias desencontradas das tevês e jornais informam que 11 crianças foram assassinadas com tiros na cabeça e abdômen.
O mundo inteiro se volta para o Brasil, para Realengo, para o Rio de Janeiro:GuardianLe Figaro e La NaciónAl JazeeraBBCEl PaísLa Reppublica eWall Street Journal - ”A tragédia choca a sociedade brasileira, de orientaçao familiar e onde a violência contra crianças é rara”. Infelizmente, a violência contra as crianças e adolescentes não é rara no país. Existem diferentes formas de violência, adolescentes, meninos, negros são os mais vitimados. Uma pequena busca aqui no Blog mostrará alguns vídeos de policiais atirando em adolescente em Manaus, policiais espancando adolescente em Feira de Santana e tantas outras formas de se propagar a violência.
Professores exauridos, desestimulados cansam-se de denunciar a violência em várias escolas urbanas das periferias brasileiras: crianças e adolescentes expostos ao tráfico de drogas, alunos armados, roubos… Mas nada se compara ao que aconteceu nesta escola hoje. Uma escola de referência, pois tem uma política inclusiva, atende deficientes auditivos.
Na manhã de hoje a escola recebia ex-alunos para dar palestras em comemoração aos seus 40 anos. Segundo relatos de profissionais da escola de Realengo o ex- aluno, Wellington, aproveitou-se disso e se identificou como um dos palestrantes.
Não se tem ainda informações seguras sobre o que levou este jovem a matar 11 crianças de 12 a 14 anos (10 meninas e 1 menino) e ferir mais 29! Quanto a morte do atirador, a versão do sargento Alves, o primeiro a chegar na escola é de que o atirador foi baleado pelo sargento e após levar um tiro se matou.
Há uma imensa especulação na mídia televisiva e impressa sobre o perfil do atirador: desde que se tratava de um ‘extremista islâmico‘, de que era ‘filho adotivo’, ‘viciado em internet’, jovem de ‘poucos amigos’,  ’portador do HIV’…
Esse é um momento perigoso, onde empresas jornalísticas em busca de audiência exploram como podem esta imensa tragédia: islamismo, adoção, internet e portadores de HIV tornam-se explicações fáceis para nossas mentes bestificadas diante do absurdo que é crianças serem mortas dentro da escola.
Ouço na Record News o absurdo do apresentador João dizer que ataques como este é ‘normal’ no Oriente Médio! Tevês dizem que o atirador deu mais de 100 tiros! Como seria possível dar mais de 100 tiros se o atirador portava dois revolveres de calibre 38?  Como este jovem tinha tanta munição? Como conseguiu as armas? Como fomos capazes de dizer não ao desarmamento e sim ao comércio de armas?
Tento escrever este texto em busca de alguma organização mental, emocional. Sou mãe, educadora, não posso sequer imaginar a dor incomensurável desses pais que deixaram seus filhos na escola, porque é um espaço de saber, um espaço de formação, um espaço de cidadania, um direito das crianças e adolescentes frequentarem de modo seguro, um dever de governos proverem e uma obrigação constitucional dos pais enviarem seus filhos.
No meio de tantas especulações feitas pela imprensa, é preciso ressaltar o bom senso do prefeito Paes ao se pronunciar: não espalhou pânico, defendeu a escola como um espaço da comunidade.
A presidenta Dilma Rousseff fez um pronunciamento visivelmente emocionada em solidariedade às famílias e as crianças vitimadas.
A ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário sabiamente ressaltou que neste primeiro momento é preciso oferecer toda a solidariedade e apoio às crianças da escola e as famílias das vítimas e, ao mesmo tempo, lembrou à imprensa de sua responsabilidade, para que evitassem espetacularizar esta tragédia espalhando pânico entre as crianças. Rosário rememorou, por exemplo, como a imprensa explorou o caso da menina Isabela. Mesmo assim na Record News prosseguia insistindo no ‘argumento’ de que nos ‘demais países’ isso é ‘terrorismo’ e se não iremos tratar assim também! Como pode uma tevê propor esta abordagem sem qualquer investigação?
Como pode políticos oportunistas como o deputado Marcos Feliciano mais uma vez se aproveitar de uma tragédia sem precedentes no país pra espalhar seus dogmas equivocados, intolerantes, irresponsáveis e afirmar que tal tragédia é uma profecia divina pra castigar infiéis?
Gostaria imensamente que aprendêssemos como tragédias como estas. As escolas não devem virar prisões (algumas já têm este aspecto) elas devem ser espaços valorizados pelas comunidades, devem ser fortalecidas, queridas, abraçadas, nossas crianças efetivamente protegidas, tratadas com dignidade para que cresçam amando o conhecimento e diminuindo o grau de intolerância. Nossos profissionais da educação devem ser valorizados, porque é uma imensa responsabilidade e exige uma tremenda formação profissional formar futuros cidadãos.
Que esta tragédia não sirva para os oportunistas de sempre pregarem mais e mais intolerância. Que possamos aprender com Hannah Arendt a lição maior da autoridade: o mundo adulto é responsável pelas gerações futuras. Não fujamos de nossas obrigações. Isso significa que todo adulto deve ser responsável por qualquer criança. Isso significa, por exemplo, olharmos para além dos nossos umbigos, de nossas crias, de nossos alunos, isso exige de nós um compromisso maior e real com políticas públicas que sejam capazes de incluir, educar, prover de espaços culturais e de lazer, formar e amar todas as nossas crianças. Elas merecem um futuro melhor que balas na cabeça em seu espaço escolar.